Ilustração em feltro: Mel Votta
Como de praxe, Jurema foi trabalhar. A cada dia que passa o metrô de São Paulo está cada vez mais infernal. Pessoas se acotovelando, brigando por meio metro quadrado, disputando o corremão e a gripe do porco rolando solta.
Ontem disseram pra Jurema, que se soubéssemos onde as pessoas colocavam a mão, jamais cumprimentaríamos. Eu hein!
Bom, hoje foi um dia como todos na vida da Jurema. Mas cada dia ela observa algo diferente no comportamento sub-humano das pessoas, principalmente no que diz respeito ao transporte coletivo.
Quando inventaram essa merda de autofalante nos celulares, ler um livro no metrô ou ônibus ficou quase impossível, uma tarefa transcendental, um estado profundo de meditação, onde deve-se desligar completamente os ruídos, cheiros, papos cabeludos, cotoveladas, empurra-empurra pra poder conseguir ler duas palavras.
Pois bem. Jurema estava chegando ao seu destino final quando ao seu lado senta-se uma jovem estilo *Paty-favelinha, com uma merda de um celular rosa-pink, ouvindo funk carioca no talo pra quem quisesse e quem não quisesse ouvir. Jurema suspirou fundo, levantou os olhos por cima do livro e mirou os olhos na garota que não se abalou.
Jurema olhou para os lados pra saber se somente ela havia se sentido incomodada com tamanha falta de educação e falta de noção. Outras pessoas sentiram-se como se estivessem sentadas em pedregulhos pontiagudos, como chamamos vulgarmente de pula pirata!
Mas a menina não se intimidou e ainda insinuava passos sentada na cadeira com sua calça tapa-sexo e blusinha colada, deixando a mostra sua excelente forma física (redonda).
Era perceptivelmente escroto o exagero da vestimenta e a ausência de gosto musical, quando a menina mudou de banco!
Jurema se sentiu levemente aliviada, mas a figura sentou-se a dois bancos de distância.
- Que caralho, será que ela não se toca?
Não Jurema, semancol? Imagine, as pessoas não sabem o que é isso nem nunca ouviram falar. Seria necessário tomar 10 doses diárias para recuperar ou tentar melhorar tamanho egoísmo.
- Na minha época, existia fone de ouvido.
Na minha também, Jurema. Hoje as pessoas competem pra ver quem tem o autofalante mais alto e a sonzera mais da hora mano!
- Não vejo a hora de comprar meu mp3 pra poupar meus ouvidos dessa porcaria toda!
Sim, Jurema, entre outras coisas também, como a conversa aberta entre duas mulheres comentando sobre suas experiências sexuais para quem quisesse ouvir.
Pois é, novamente, a Miséria S/A agradece e nossos ouvidos também.
*Paty-favelinha: ser humano de sexo feminino, moradora ou frequentadora assídua de região periférica, característica vestimenta desprovida de requinte e discrição. Possui comportamentos exacerbados principalmente em locais públicos e coletivos.